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Tamires Lima - Ilustradora e Designer

por João Taboada31/05/2020

Tamires Lima é ilustradora e designer nascida no Recife (PE). Já lançou livros, dá palestras e faz, periodicamente, oficinas e contação de histórias para crianças. Como se não bastasse, essa pernambucana/baiana ainda é professora na Escola de Belas Artes (EBA – UFBA) - universidade na qual ela mesma se formou - e é coordenadora de produção da revista em quadrinhos Cupim Conta Contos.

VA - Tamires, fale um pouco sobre você e sua formação. 
TL- Eu considero que tive uma formação em espaços formais de ensino, como a Universidade, e também em espaços não-formais, através do contato com minha mãe Rozimar, professora de crianças, e em todas as oficinas de brinquedo e eventos literários que me fizeram aprender mais e me tornar quem eu sou. Desde criança sempre fui fascinada pela Turma da Mônica e dizia que seria desenhista igual ao Maurício de Sousa. Meu pai Silvanio também nos levava aos eventos literários, alguns sobre a Turma da Mônica e, assim, eu e meu irmão Rodolfo tivemos muito acesso à leitura. Ao terminar a escola, descobri a profissão de Desenho Industrial - que atualmente se chama Design - na Universidade Federal da Bahia e lá estudei entre 2008 e 2012. Meu trabalho de conclusão de curso foi Fabrincando, um livro que ensina a fazer brinquedos e, a curiosidade em saber qual a motivação do artesão em criar brinquedos me levou, em 2013, ao Mestrado em Desenho, Cultura e Interatividade da Universidade Estadual de Feira de Santana. Lá pesquisei sobre a história de brinquedos de marisqueiras no bairro Paripe, em Salvador–BA. Ao finalizar o curso em 2015, aconteceu o lançamento do livro Fabrincando e, a partir daí, pude apresentar livros em muitos espaços nacionais e internacionais como México e Moçambique. Posso dizer que o contato com crianças de múltiplos contextos me fez aprender muito. Conheci crianças da capital e do interior, crianças com deficiências físicas e crianças com questões psicológicas específicas, como as autistas. Cada experiência me trouxe um novo olhar, um aprendizado de como conduzir as atividades dentro de um contexto. Mas o principal foi aprender com elas que toda criança merece a chance de criar e de se apropriar de sua criação. 


VA – Você ensina Design na Universidade Federal da Bahia, correto? O curso, hoje, oferece uma estrutura adequada à sua atividade de professora? 
TL – Sim, desde 2017 sou professora assistente A da Escola de Belas Artes da UFBA, com foco em matérias que versam sobre experimentação gráfica envolvendo diversos cursos e criação de projetos de Design. Tento manter aproximação com todos os cursos da EBA através de eventos e projetos de extensão, tais como o Cupim: Narrativas Gráficas e Artes Visuais. Eu considero que a formação na EBA proporciona a interação entre os cursos, os materiais e técnicas e, desta forma, o designer não se torna um profissional com foco extremo em técnicas digitais, mas sim na mescla entre técnicas e o trabalho em equipe por meio das habilidades de cada um. Para mim tem sido bem interessante, pois a estrutura fluida me permite continuar sendo ilustradora, trazendo a pesquisa em ilustração para projetos de extensão. Assim, nós criamos juntos. 


VA – Você exerce, profissionalmente, três atividades diferentes, ainda que estejam ligadas e possam se complementar. Entre o design, a ilustração e o ensino, você colocaria alguma delas como lhe sendo mais importante, ou, para você, cada uma se adequa à necessidade do momento? 
TL – Para mim as atividades conversam entre si. Diria até que existe uma quarta atividade que é a pesquisa e, nesse caso, pesquiso sobre Educação Inclusiva para surdos por meio de jogos e livros. Acredito que a Ilustração é minha atividade prioritária, que me motiva a exercer as outras. O design me guia para criar o projeto, planejando as etapas e as parcerias, sendo que se for projeto de livro, tratamos de um tipo específico de projeto, o design editorial. E o ensino é a válvula de transmissão de tudo que venho criando e também o caminho para ajudar os jovens a aprender como gerenciar um projeto e como dar vida às suas ideias. Eu penso que não tenho como ser professora de algo que não exerço e, assim, as atividades de ilustradora/designer ajudam a me manter constantemente atualizada e levar essas experiências aos alunos. 


VA – Você disse que criou seu primeiro livro, Fabrincando, em 2012. O que é o livro e como foi essa experiência? 
TL – Fabrincando é um livro que ensina a fazer brinquedos populares. Ele mostra um pouco da história dos brinquedos no mundo, a importância dos artesãos e como utilizarmos materiais domésticos e recicláveis para fazer brinquedos. Ele é meu xodó. Foi meu projeto de TCC em Design e, em 2014, foi contemplado para o edital de Culturas Identitárias da Secult, tendo depois disto, crescido muito. No projeto oficial gerou um ciclo de oito oficinas de brinquedos em escolas públicas da Bahia (Brasil), além da publicação do livro (com tiragem de 2250 exemplares), em que 920 cópias foram distribuídas em bibliotecas públicas, escolas, universidades, ONGs e brinquedotecas. Fabrincando teve também dois desdobramentos internacionais: um no México, nos projetos “Brincantes”, e “Fabrincando na Feira Internacional do Livro de Guadalajara”, ambos em 2016, pelo edital de Intercâmbios do MinC e Edital de Mobilidade Artística da Secult. Para mim foi uma experiência incrível descobrir que temos tanto para compartilhar e aprender se estivermos dispostos, e também porque cada criança que aprende a fazer o brinquedo ensina a deixar a vida mais leve com o prazer das descobertas. 


VA - Você já participou de uma diversidade de eventos relacionados à educação de crianças. Como a arte-educação entrou em sua vida?
TL – Eu acredito que para ensinar precisamos estar dispostos a aprender também, e aprender junto é melhor. Não temos todo o conhecimento específico sobre determinado assunto - ainda bem -, então, quando promovemos a educação, a troca parece muito mais relevante. A arte-educação faz parte do meu cotidiano desde criança porque minha mãe é professora de ensino infantil na rede municipal e dentro das dificuldades do contexto eu sempre a ajudei. Sempre desenhei os painéis, formas e figuras que seriam usadas nas brincadeiras e atividades da escola. Assim, minha condução para arte-educação através das oficinas do livro Fabrincando foi natural. Não tenho formação em cursos específicos, mas aprendi bastante ao lidar com crianças em vários contextos e eventos que proporcionaram esses encontros como, por exemplo, a Virada da Educação Bahia, além de encontros internacionais na Biblioteca Vasconcelos (México) e no Centro Cultural Brasil Moçambique (Moçambique). 


VA – Na área do design não temos muitas referências negras. Na arte, de forma geral, isso já é mais democrático. Você, enquanto professora, tem percebido uma inclusão maior do negro na atividade de design, especialmente através da universidade? 
TL – Eu tenho percebido mais alunos negros no curso de Design sim, mas ainda é muito desigual a distribuição de oportunidades como estágios e tempo para fazer os trabalhos universitários - considerando que a maioria de meus alunos negros vem de realidades tão diversas. Existe uma valorização de estudantes que tem domínio das ferramentas digitais e, aprendê-las, também requer tempo e equipamentos. Então eu acredito que ainda temos um caminho longo de mudanças, mas tenho uma expectativa positiva.


VA – Pelo seu trabalho, é possível identificar uma tendência à subversão de padrões estéticos, inclusive, com mistura de técnicas, tanto na área de design quanto na área de ilustração. A experimentação é uma saída eficiente? 
TL – A experimentação é o que move tudo. Eu acredito na busca de novas soluções para novos projetos e, assim, a mistura de técnicas tem me trazido respostas bem interessantes. Normalmente trabalho com técnicas manuais e depois brinco com elas digitalmente. Nem sempre foi assim: antes eu trabalhava mais com o digital, mas numa tarde quis tentar algo novo e percebi como é possível conversar com as duas técnicas. Sobre os padrões estéticos é uma questão de pensar em quem os criou e a quem atende. Se não me atende, eu crio meus próprios padrões e penso na importância de valorizarmos a diversidade de pensamento de cada um. 


VA – Ainda sobre esse tema, você tem um estilo de ilustração que busca a simplicidade nas formas e no preenchimento. Isso é uma preferência ou o flerte com técnicas mais rebuscadas (ou realistas) depende da circunstância? 
TL – Tenho preferência pela simplicidade, pois acho de extrema inteligência quando conseguimos chegar numa solução do desenho com poucas linhas. Penso sempre no poder da expressividade com menos formas e traços, por isso, prezo pela objetividade no desenho. Desde criança já tinha essa predileção e acompanhava ilustradores como Ziraldo, por exemplo. Apesar de já ter feito cursos de desenho e saber utilizar a técnica mais realista, a simplicidade é uma escolha consciente. 


VA – A despeito dessa tendência moderna de se utilizar programas cada vez mais avançados em nome da produtividade (o que gera, inclusive, uma rivalidade infantil por este ou aquele software), seu trabalho parece bastante livre. O “hand made” está ganhando mais espaço? Como você enxerga isso?
TL – Tenho percebido um retorno às técnicas manuais em vários contextos. Desde o desenho até a comida. Percebo que a ideia de desacelerar e repensar a forma como estamos vivendo tem impactado nos produtos que queremos consumir, no que queremos ver quando assistimos algo ou quando lemos livros. Então percebo uma retomada do simples e uma valorização em fazer algo com cuidado e dedicação. Assim, eu sinto que minhas produções tem ganhado visibilidade e isso me anima muito em continuar aprofundando as experimentações e transformando sempre o meu estilo. 


VA - Fale um pouco sobre o projeto da revista Cupim Conta Contos.
TL – A revista é uma coletânea de oito contos afro-brasileiros e indígenas no formato de Histórias em quadrinhos, realizada por mim e pelos estudantes Danilo Itabira, Edivan Menezes, Emilly Góes, João Silva, Júlia Fadigas, Larissa Ribeiro e Rogério de Jesus, todos membros do projeto de extensão Cupim: Narrativas Gráficas e Artes Visuais, situado na Escola de Belas Artes – UFBA. A primeira etapa foi inserir estudantes das escolas públicas no processo. Assim, foram oferecidas oficinas em duas escolas públicas de Salvador - Bahia - Brasil (Escola Estadual Carlos Santana e Escola Estadual Cupertino de Lacerda) para apresentar o universo criativo da ilustração e dos quadrinhos, o que permitiu que fossem conhecidos os principais interesses dos adolescentes sobre a revista. Contou também com o suporte de pesquisadores sobre História Oral como Educardo Oduduwá e Danielle Andrade, além do profissional em quadrinhos Jaguaray Santana. O objetivo da revista foi fomentar a representatividade de pessoas negras, indígenas e seus descendentes, e buscou ser um facilitador para crianças e jovens na difusão da leitura.


VA – Você teria algum recado a dar para as pessoas que estão começando nas atividades de criação visual (artes, design, ilustração, etc.)?
TL – Acho que o mais importante é não se comparar aos outros e respeitar seu tempo e seu processo criativo. Também é importante estar disposto a trabalhar de maneira colaborativa, ouvindo todos e sabendo que cada um tem sua habilidade, seus saberes e algo para contribuir, independentemente da idade, área, formação ou ausência de formação acadêmica. Sendo assim, é preciso querer experimentar diversas áreas, materiais e técnicas e perceber que estamos no mundo para aprender, pois vivemos num mundo bastante curioso. 


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Conheça mais sobre Tamires Lima através dos links abaixo: 


https://www.instagram.com/tamilima_ilustra/?hl=pt-br 
https://tamilima.carbonmade.com/ 


Confira abaixo algumas imagens de seus trabalhos. 


Livro Fabrincando


Fabrincando - miolo


Fabrincando - brinquedo


Fabrincando - oficina


Tóim, cadê você? - livro


Tóim, cadê você? - miolo


Tóim, cadê você? - ilustração


Tóim, cadê você? - ilustração


Tóim, cadê você? - ilustração


Cupim Conta Contos - livro


Cupim Conta Contos - miolo


Cupim Conta Contos - miolo

Designer, ilustradora e professora da UFBA, Tamires Lima fala sobre arte-educação, ensino, inclusão social, projetos e realizações pessoais.

http://www.visuarea.com.br/entrevistas/tamires-lima-ilustradora-e-designer
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Palavras chave: Tamires Lima, Fabrincando, Cupim Conta Contos, Ilustração



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