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Logomarca X Preconceito

por João Taboada17/09/20140

Logomarca é um termo que, por incrível que pareça, ainda provoca discordância na área de design. A despeito de que sua aceitação vem aumentando gradativamente, podemos ver nas redes sociais posts que insinuam que um verdadeiro designer não usa determinados programas ou não fala certas palavras, como se quem postasse, tivesse algum tipo de autoridade para fazer esta determinação. 


Em 1999, a designer Ana Luisa Escorel fez uma abordagem nada amigável a respeito do termo logomarca em seu livro "O Efeito Multiplicador do Design" (Editora SENAC - São Paulo). No capitulo "Logomarca, por quê?" (p. 56) ela discorre pensamentos como "Na verdade, logomarca é uma dessas criações tipicamente brasileiras que, assim como a compulsão para inventar nomes próprios, por exemplo, definiriam o brasileiro como um indivíduo imaginoso, e pouco afeito a convenções". 


Não me parece que a predisposição para inventar nomes próprios seja uma compulsão e nem que isso impeça que, no nosso dia a dia, a gente aceite convenções. Tampouco que ser imaginoso deva sugerir algo contraproducente. Enfim, fato é que o termo logomarca já carregava um estigma negativo que, aparentemente, foi reforçado com o lançamento deste livro, o que só serviu para aumentar ainda mais a rinha "logomarca x logotipo".


Minha intenção, neste texto, é questionar se realmente devemos condenar um termo pelo simples fato de ele nos ter sido "ensinado" como incorreto - na minha percepção, a partir de argumentos fracos e com informação equivocada e preconceituosa - mesmo que, na prática, sua utilização não traga nenhum tipo de ruído de comunicação e, pelo contrário, pelo seu caráter específico, funcione de maneira eficaz. 


Abaixo, seguem os argumentos que encontrei que são utilizados para tentar condenar a palavra "logomarca": 


1 - Logomarca significa "significado do significado", portanto sem sentido. 
2 - Logomarca significa "palavra+palavra símbolo", portanto redundante. 
3 - Logomarca é composta por termos de duas línguas diferentes, portanto incoerente. 
4 - Logomarca é um neologismo, portanto não consolidado em nossa língua. 
5 - Logomarca é uma invenção brasileira, portanto não presta. 



A partir daqui, vamos tentar esclarecer algumas coisas: 



1 - Logomarca significa "significado do significado" 


Logos (λόγος) é uma palavra de origem grega. Logos, originalmente, significava palavra, verbo (dentre outros) para depois adquirir, na área de filosofia, um sentido mais amplo, algo como "razão" ou "razão divina". A depender do contexto, porém, seu significado pode variar. Por exemplo: como sufixo de palavras, logos significa, normalmente, "estudo", "ciência" ou "aquilo que versa", "aquilo que trata". Uma palavra como "Biologia", composta pelos termos bios (vida) e logos (estudo) quer dizer nada mais que o "estudo da vida" e nunca "o significado da vida" (e, de forma alguma também, "a palavra da vida"). 


Ferdinand de Sausurre, considerado o pai da linguística moderna, já definia as palavras como signos linguísticos, entidades detentoras de um significante e de um significado, nas quais a relação entre estas duas partes é de caráter totalmente arbitrário. Logos, como signo linguístico, também possui o seu significante, que é o próprio "logos" (um conjunto de fonemas) e seus diversos significados, mas em nenhum lugar do mundo e em nenhum momento da história da humanidade significou "significado". Esta é uma conclusão equivocada originada pela falta de entendimento do que seja um signo linguístico e suas partes. 


• Lembro que para o termo "palavra" - pura e simplesmente - o equivalente em grego é "lexi" (λέξη) - que originou "léxico", por exemplo. 
• Já para o termo "significado" o equivalente grego seria "sema" (σήμα) - que originou "semântica", dentre outros termos. 


"Marca", aparentemente, é um termo que tem origem no alemão (marke) ou no grego (márka / μάρκα) e significa "marca". Se vier do inglês "mark", pode ter vários significados como marca, caractere, símbolo e signo, dentre outros - como no nosso idioma. Como já foi dito lá em cima, "signo" carrega um significado mas não significa significado. Portanto, ainda que "logos" seja um signo linguístico e "márka" possa significar "signo", "logomarca" nunca teve como significado "o significado do significado" porque "logos" ≠ "significado" e "márka" ≠ "significado". 



2 - Logomarca significa "palavra+palavra símbolo" 


Logomarca é uma palavra formada por justaposição. Seus elementos se mantiveram intactos quando da sua junção, porém, o sentido, o significado deste novo termo, se alterou para além do significado das duas palavras originais que o formaram. Assim aconteceu com palavras como "amor-perfeito" (flor), "cachorro-quente" (comida) e "passatempo" (jogo). Logomarca, segundo as pessoas que a condenam, tem uma redundância na junção porque "logo" significaria "palavra" e "marca" significaria "uma marca empresarial pronta, constituída de uma palavra mais um símbolo". Ok, logos vem do grego e possui vários significados, dentre eles "palavra", que seria o termo utilizado aqui. Isto faz sentido. 


Mas marca também possui vários significados, o que inclui o significado de "símbolo" e não, necessariamente, de uma marca empresarial, constituída de "palavra+símbolo". Seria um pouco de pretensão achar que o termo "marca" significaria aqui justamente a marca gráfica completa de uma empresa, quando ela pode ter várias outras significações como a de uma pegada, uma mancha ou de um símbolo gráfico qualquer elaborado por um designer


Além do quê, os vocábulos que se juntam e formam um novo não precisam ter, obrigatoriamente, uma relação lógica entre si. Termos como "vaivem", formado por palavras opostas e "mata-mata" formado por palavras iguais e de mesma significação não são questionados por estes fatos. O importante, mesmo, é que este novo conjunto de fonemas satisfaça à necessidade dos falantes a partir de seu entendimento. 



3 - Logomarca é composta por termos de duas línguas diferentes 


Ok, a palavra "logomarca" pode sim ser composta por termos de duas línguas diferentes (como já foi comentado), algo considerado inaceitável por quem a reprova. Mas um termo como "sociologia" que têm origem no latim "socius" e no grego "logos" não é considerado errado por este motivo, assim como o termo "ufologia" - de "Unidentified Flying Object (inglês)" + "logos (grego)". 


Também não vemos as pessoas discutirem se na palavra "tipologia" - usada erroneamente no lugar de "tipografia" (que cai na mesma situação) - "tipo" vem do latim ou do grego, afinal, se o termo já consolidou seu significado, é isto que importa, e não a sua origem. 


"Design Gráfico" também é composto por duas palavras, uma oriunda do inglês e outra do português, e os designers utilizam este termo para se referir à sua profissão sem culpa e sem questionamentos. Lembro que design não é uma palavra considerada como pertencente à nossa língua, mas sim, um estrangeirismo, e designers adoram usá-la sem problematizar sobre este detalhe. Portanto, não há crime em se ter um termo composto por palavras originadas de diferentes línguas. Nossa comunicação usual, inclusive, utiliza palavras originadas de outras línguas constantemente (que se misturam à nossa todos os dias) como pizza, beer, performance, hamburguer, site, pendrive, hashtag e ninguém que usa se condena por causa disto. 



4 - Logomarca é um neologismo 


Já faz um bom tempo que "logomarca" deixou de ser neologismo. Para quem utiliza o termo sem saber o que é, neologismo é quando uma nova palavra ou expressão é criada em uma língua, ou até, quando um termo já existente nesta língua adquire novo significado. O que define a condição de uma palavra ainda ser ou não neologismo é o fato de ela estar dicionarizada ou não. 


Os lexicógrafos (ou dicionaristas) são aqueles estudiosos que se encarregam de identificar nosso léxico (palavras pertencentes a uma língua) e catalogá-lo em dicionários. Quando eles entendem que uma palavra deixou de ser apenas um termo passageiro e já consolidou seu uso na língua, este termo é inserido nos dicionários. Então, a partir daí, a palavra passa a ser considerada como usual do léxico e não mais neologismo. "Logomarca", para quem ainda não se deu ao trabalho de conferir, já é um termo constante nos principais dicionários nacionais e também está incluído no VOLP e, sendo assim, não há muito mais o que questionar. 



5 - Logomarca é uma invenção brasileira 


Este é o tipo de argumento que nem vale a pena se gastar muito tempo. Com um pouco de pesquisa a gente vê que existem sim, referências ao termo logomarca (logomark) em literaturas de outras línguas. Se é um termo importado então não é criação brasileira - e isso já tira o mérito do argumento. Se for criação brasileira, isto, por si só, não tira o mérito do termo, afinal, o fato de algo ser criado no próprio país não o torna nada pior do que se fosse criado no exterior. 


Utilizar a expressão "criação tipicamente brasileira" (como disse Escorel) para dar a entender algo sem valor é como desvalorizar prematuramente qualquer criação nacional, inclusive soluções na área de design. Seria como valorizar o que vem de fora, rechaçando o que é produzido aqui, determinando que o que criamos não presta e, por fim, negando nossa própria capacidade de trabalho. 



Analisando termos 


Logo - Aparentemente, é uma abreviação de logotipo. Um logo pode ser apenas um símbolo ou sua união com o nome da empresa ou produto. 
Logotipo - É o nome da empresa ou produto escrito de uma determinada forma. Alguns o consideram também como designativo de uma marca completa, com texto e símbolo. 
Marca - Pode ter vários significados, incluindo o de signo, símbolo, um ícone, uma palavra, uma marca psicológica, etc.
Logomarca - A marca visual completa de uma empresa, produto ou serviço, formada por um símbolo e um texto.
No design gráfico, costumamos, usualmente, entender o termo marca com o mesmo significado de logomarca. Para as áreas de publicidade, ADM e marketing, porém, marca transcende a simples questão visual, e passa a carregar consigo a história de uma empresa, seu valor financeiro e a relação criada com um determinado público.


É possível se perceber que não há muita precisão de significado para os termos citados. Se a gente procurar em dicionários ou pela internet vai perceber isto. Outros termos como "marca gráfica" e "identidade visual" também funcionam como equivalentes aos de cima. Mas, se os significados atuais não são muito precisos, seria correto voltar no passado e considerar os termos pela etimologia? Se é verdade que uma simples palavra pode ser medida em seu valor ou precisão pelo seu significado etimológico, então é justo que analisemos termos relacionados (ou derivados) sempre pelo mesmo viés. 


Assim, se a gente considera que no termo logomarca a junção "logo+marca" significa "significado do significado" então, seria correto dizer que: 


• "Logo" significa "significado", logo 
• "Logotipo" significa "significado do tipo", 
• "Logomarca", como já dito, significaria "significado do significado" e, portanto, 
• "Marca" significaria "significado" também. 

Considerando desta vez que no termo logomarca a junção "logo+marca" significa "palavra+palavra símbolo" então, temos que: 

• "Logo" significa simplesmente "palavra", logo 
• "Logotipo" significaria "palavra tipo", e 
• "Logomarca", como já dito, significaria "palavra+palavra símbolo" e, portanto, 
• "Marca" significaria "palavra símbolo" (pelo menos, essa se salvou). 

Então, é importante perceber que se a gente discrimina "logomarca" pela sua suposta etimologia sem sentido, acabamos condenando também (pelo mesmo motivo) outras palavras formadas pelos mesmos termos de origem. Na minha opinião, uma posição nada inteligente, afinal, o que importa em nosso dia a dia é conhecermos nos termos seus significados e ortografia atuais. Se assim o for, a comunicação se processa de forma correta e sem interferências. 


Remoendo tudo 

Existe uma característica nas línguas vivas - como em nossa língua portuguesa - chamada de polissemia. Polissemia é quando uma língua se expande, com suas palavras adquirindo novos significados, criando, inclusive, neologismos e tornando a língua mais versátil. Isto é próprio da língua e nós não temos como controlar. Aliás, as línguas vivas, a todo momento, criam modismos, absorvem termos de outras línguas, expandem suas palavras já existentes, criam gírias, etc. O que define a pertinência dessas alterações é a aceitação popular. Isto quer dizer que, não existe problema numa palavra apenas por ela ser uma palavra nova (neologismo).

Pelo contrário, às vezes, as palavras existentes não são capazes de exprimir um novo recurso como web, um novo jeito de ser como descolado, uma nova profissão como digital influencer, uma nova ação como tuitar e, por isto mesmo, são criadas. Estas palavras, quando não são estrangeirismos, são neologismos. Mas normalmente, as pessoas inseridas dentro de um determinado contexto acabam por usar estas palavras novas sem se importar em que tipo de "ismo" elas se enquadram e nem sua origem. O importante é se comunicar e, quem sabe, ser um descolado digital influencer, que tuíta na web, correto? 

Mas em design, estrangeirismos são quase uma regra, a começar pelo próprio nome da profissão, que, ao contrário dos espanhóis, por exemplo, que foram capazes de criar um termo próprio em sua língua para definí-la (Diseño), nós, incrivelmente, não conseguimos. Nós, brasileiros, falamos UX, SEO, RGB, CMYK, HTTP, FTP, CD, DVD, web, internet, pendrive, file, flyer, folder, rough, layout, feeling, briefing, branding, marketing, tablet, browser, smartphone, mobile, screen, plugin, gadget, widget, app, pixel, site, blog, e-commerce, e-mail, e-book e sketchbook, dentre vários outros termos, e achamos tudo muito natural. 

Mas quando criamos uma palavra como logomarca - um simples conjunto de fonemas - a condenamos. Esta, além do público em geral, é utilizada pelas pessoas que não pertencem à nossa profissão de designers - normalmente administradores de empresas, publicitários e profissionais de marketing. Nestas três profissões existe o entendimento de que o termo "marca" (como utilizam os designers) simboliza algo mais que a simples representação gráfica do nome da empresa, e por isto, quando se referem especificamente a essa representação visual, a chamam de logomarca - ao invés do abrangente termo "marca". Para nosso entendimento, "marca" já satisfaz. Para eles, "logomarca" satisfaz.

Nós criamos as marcas e eles a gerenciam. Até aí, tudo correto, afinal, se o designer não quer fazer o trabalho de pesquisa sobre como uma marca está sendo aceita pelo consumidor, o profissional de marketing pode fazê-lo. Interessante, inclusive, é que, quando compramos um produto pela marca, não o fazemos pela estética da marca, mas pelo que ela representa para nós enquanto consumidores. ADMs, "marketeiros", publicitários e designers, aliás, não são inimigos entre si. Mas é mesquinho quando achamos que os publicitários "querem meter o bedelho na nossa profissão". Cada um faz o seu trabalho e as profissões se completam. E cada um chama marca/logomarca da forma como parece melhor dentro do seu contexto. 


Finalizando 

Rejeitar palavras apenas porque não foram criadas em cima de regras é um grande erro. E em virtude de sua etimologia é pior ainda. Utilizamos diversas palavras no nosso dia a dia que são criadas sem obedecer a uma lógica de formação e que já existem antes de nos tornarmos profissionais e, quem sabe, antes de nascermos. O importante é que a gente consiga entendê-las na pronúncia e na escrita. Assim seus significados serão compreendidos, independente de sua morfologia ou de sua origem. 

Falar em "termos corretos da profissão" é bom, mas, se existem outros similares, e que são mais usados, talvez devamos repensar se são estes os que estão errados. Se os utilizamos em sua forma gramatical correta e as pessoas entendem, não há porque de estes termos não poderem existir. É assim que as línguas vão se transformando e, por incrível que pareça (como mostrou Saussure), é assim que elas se perpetuam. 

Mas nunca conheci um designer que, de fato, entendesse de etimologia. Acho que designers entendem é de design, porém as pessoas costumam tocar no assunto etimologia para rejeitar certas expressões, inclusive, como se o dominassem e, como se fossem, elas, proprietárias de uma língua que é falada e definida por milhões de outras pessoas. 

Claro, todos devem ter direito à sua opinião. As pessoas podem, inclusive, discordar do que foi escrito aqui, mas é importante que, antes, estudem para que as contra-argumentações não pareçam apenas expressão de seu ressentimento. 

Para concluir, acredito que ninguém deve ser recriminado por utilizar determinadas palavras. Apenas as pessoas devem se informar para que se comuniquem de maneira inteligível. E é um erro quando condenamos os outros com base em "achismos" e preconceitos originados da pura desinformação. É bom lembrar que nós mesmos, em alguma circustância, podemos ser condenados por coisas que nem achamos que temos obrigação de saber. 

Grande abraço. 


Nota 1: artigo revisado em 07/03/2019

Nota 2: perceba que, no texto acima, as palavras que não são originais de nossa língua, ou foram colocadas dentro de aspas ou foram italizadas. Isso, mesmo não sendo obrigatório para boa parte delas, foi uma maneira de mostrar o quanto palavras de outras línguas fazem parte de nosso vocabulário. O uso de palavras estrangeiras, assim como a criação de palavras novas na nossa (que podem, inclusive, não ter lógica em sua formação) não tira o mérito da minha, da sua e nem da língua de ninguém. 

Logomarca X Logotipo X Preconceito. Veja porque a richa entre logomarca e logotipo não faz nenhum sentido.

http://www.visuarea.com.br/artigos/logomarca-x-preconceito
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Palavras chave: logomarca x logotipo, logomarca x logotipo x preconceito, logotipo x logomarca, marca x logomarca x logotipo, logomarca significado do significado



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