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A disposição da marca gráfica no leiaute

por João Taboada13/09/20220

Há vários anos, nas discussões sobre aplicação de marca, mais especificamente, em leiautes de anúncio, insistia-se na ideia de que aquela (a marca) deveria ser sempre posicionada no final do documento por se configurar como o elemento mais importante da composição e que, privilegiada nessa localização, permaneceria fixada por mais tempo na cabeça do possível consumidor, uma vez que, segundo se afirmava, "o olho para no final". 


Esse raciocínio, em virtude de à época não ser apresentada nenhuma informação técnica que o respaldasse de forma concreta, soava como uma suposição de feitio "decoreba" e que, como agravante, ainda era estendido a diversos outros tipos de material gráfico.  


Faço ressaltar que a existência deste artigo se deve exclusivamente (ou quase) ao fato de que é muito difícil se encontrar textos abordando esse assunto. Na tentativa de chegar a uma resposta que pareça razoável, coloco aqui alguns raciocínios e exemplos que possibilitem rever esse ponto de vista - e, quem sabe, fazer uma contraposição a essa explicação. 



Mas qual a verdade e lógica que existe nesse argumento? 


Bom, antes que a gente sugira como posicionar a logomarca em algum lugar de nosso leiaute, é importante, primeiro, tentar conceituar leiaute.


Essa conhecidíssima palavrinha - que já existe em português mas que muitos ainda não sabem e acabam por utilizar o estrangeirismo "layout" (mesmo que isso não seja um grande problema) - significa, grosso modo, uma composição que representa o resultado final de um projeto gráfico. É uma ideia prévia de como essa representação vai aparentar depois de produzida. O termo leiaute  pode significar também a disposição de móveis e objetos em um ambiente, como uma sala de estar, um saguão ou um espaço de trabalho de uma empresa, pois o termo se tornou mais amplo. Mas aqui, estou falando especificamente de um leiaute gráfico, uma concepção visual organizada a serviço de uma comuniçação qualquer. 


Enfim, de uma composição gráfica, geralmente, fazem parte textos, imagens, linhas ou formas geométricas, numeração ou qualquer outro elemento necessário a essa composição em que, nela, cada um assume um papel particular e uma importância relativa. 


Pelo treino, qualquer designer sabe mais ou menos como dispor esses elementos de uma maneira mais lógica e correta no arranjo visual que está sendo criado. Títulos em cima, textos e figuras entre o topo e o rodapé e marca gráfica embaixo. Naturalmente, a apresentação, tamanho e posição desses elementos pode variar (às vezes, até bastante) mas é muito comum seguir esse padrão. Difícil, por exemplo, ver o título ou a chamada do documento no rodapé. Ou a logomarca assinando em cima. Usualmente, seguimos a ordem de leitura à qual fomos ensinados que é da esquerda para a direita e de cima para baixo (que é a nossa ordem de leitura ocidental e que já possui, pelo menos, alguns milhares de anos). 


Deduzimos, então, que essas coisas todas que compõem o nosso leiaute devem ser posicionadas em um sequência hierárquica porque obedecem a uma ordem de decodificação que faz com que a apreensão da mensagem se dê através da percepção sucessiva dos elementos. Existe uma coerência nisso e, geralmente, não questionamos, ao tempo em que nos utilizamos desse padrão para fazer valer nossa comunicação (mais ou menos como eu faço nesse texto que você está lendo agora). 


Diagrama de Gutenberg (1), também conhecido como Padrão Z de Processamento e bastante popular na área de design, ilustra bem esse pensamento. 



Diagrama de Gutenberg e o caminho preferencial da leitura ocidental


Segundo seu entendimento, as áreas de maior força visual são o topo à esquerda, o centro e a parte final, à direita (1, 3 e 5), enquanto que as áreas que recebem menor atenção ótica são o topo à direita e o fundo à esquerda (2 e 4). Esse caminho percorrido pela visão é chamado de gravidade de leitura e é tido por muitos como um padrão a ser seguido quando se quer que num documento sejam exaltados (e memorizados) os elementos mais importantes (que ficariam localizados nessa diagonal principal). 


Essa ideia, no entanto, é contestada no livro Princípios Universais do Design no qual os autores defendem que o padrão Z de processamento funciona melhor em composições mais textuais e de aspecto mais homogêneo pelo fato de que não existem nesse tipo de composição elementos capazes de direcionar o olho para um ponto mais específico. Sendo assim, numa composição de design mais livre (como nas figuras abaixo), onde os elementos estariam distribuídos estrategicamente, esse príncípio não se aplicaria (ou, pelo menos, não teria muito efeito). 


 Perceba que um elemento mais chamativo colocado em um ponto determinado conduz o olhar do observador para esse ponto, estabelecendo aí uma importância visual maior.


Com a utilização do padrão Z, portanto, é de se supor que nossas criações terão menos probabilidade de erro (mesmo que não exista grande consenso sobre isso) já que há uma tendência para nós ocidentais em obedecer a esse caminho de leitura. Mas não impede, porém, que nos utilizemos de nosso conhecimento e nossa criatividade para transpor essa regra e criar resultados visuais mais surpreendentes (sem que a gente perca com isso o aspecto funcional). 



Mas onde entraria a marca em nossos leiautes? 


Boa pergunta. Na verdade, este é um questionamento que permite respostas variadas. Cada material em design possui uma função particular, portanto, não pode ser tratado da mesma maneira que outro. Destarte, o tipo de informação e sua disposição vai entrar no leiaute em proporções e posições diversas também. Observe os exemplos abaixo. 



Websites (marcas - geralmente pequenas - no topo - centralizadas ou à esquerda) 


Revistas impressas de banca (marcas no topo - centralizadas ou à esquerda) 



Jornais impressos (marcas no topo - geralmente centralizadas) 



Formulários impressos (marcas no topo, à esquerda ou à direita - em razão do título, usualmente, ser posicionado ao lado da marca) 



Cartões de visita (marcas em disposições variadas) 




Anúncios publicitários (marcas em posições diversas - mesmo que, preferencialmente, embaixo à direita)


Livros (marca à esquerda, direita, centro topo ou centro fundo)



Nessa considerável quantidade de exemplos exposta acima, é possível perceber a diversidade de materiais gráficos existentes e suas múltiplas possibilidades de aplicação de logomarca (inclusive, estão mostrados aqui apenas designs planos. Designs de produto (tridimensionais) ainda podem ter outras alternativas de posicionamento. É lógico que para cada tipo de material existe um padrão predominante como, por exemplo, para revistas e jornais a marca sempre é aplicada no topo. Para anúncios publicitários e livros a marca usualmente vem embaixo. Mas são regras que podem possuir exceções e isto não se consiste num problema (ou erro). 


Mas a marca não foi feita para assinar? Então, deveria vir embaixo, correto? 


Não. Marcas gráficas foram criadas para identificar. Identificar uma empresa que anuncia um produto, identificar a fachada dessa empresa, identificar a empresa em seu papel timbrado, indentificar nas bancas um jornal ou revista de sua preferência, identificar um produto no supermercado, identificar no carro qual empresa produz aquele modelo, etc. 


O termo "assinar", nesse caso, é uma atribuição emprestada, uma analogia. Quando alguém assina uma carta, esse alguém, de fato, escreve seu nome de punho se responsabilizando por tudo o que está escrito acima. Em um anúncio ninguém escreve, mas a empresa anunciante coloca sua marca "no lugar da assinatura", assumindo a responsabilidade pelo produto ou serviço que está sendo divulgado - daí a conexão entre as duas coisas. 


Acatando essa lógica, a relação com o "assinar", portanto, faria mais sentido num anúncio publicitário, porque, seguindo o Diagrama de Gutenberg, nesse tipo de material, grosso modo,  há a chamada para o produto (ou serviço) no primeiro momento da leitura, em seguida um texto explicativo/imagens, para, lá embaixo, no momento final, a marca assinar, identificando a empresa que está anunciando. 


Mas para jornais e revistas, por exemplo, que são impressos periódicos, o princípio é outro porque, estes, precisam ser facilmente identificados pelo consumidor que regularmente os procura, seja pelo tipo de conteúdo, seja por sua linha ideológica. E pelo modo como são posicionados nas estantes, para ser vista, sua marca deve, obrigatoriamente, vir em cima. O que não acontece com seus irmãos, os livros. Nestes, não faz tanta diferença onde a marca fique porque, em primeiro lugar, ela fatalmente vai ser localizada e, depois, independentemente da editora que produz, a aparente importância do conteúdo, sugerido pelas informações da capa e da orelha, é quem vai vender o material. 


Mas se a logomarca for posicionada no final, não será mais facilmente memorizada? 


Existe um princípio em design chamado "Efeitos da Posição Serial (2)" - relativo aos efeitos de primazia e recência - que diz que itens do começo e do final de uma lista são mais lembrados que os itens do meio. O "efeito de primazia" acontece quando os itens do início são lembrados enquanto que o "efeito de recência" ocorre quando os itens do final são lembrados. O efeito de primazia afeta a memória de longo prazo, que faz com que as lembranças durem mais tempo. O efeito de recência afeta a memória de trabalho e só permite que as coisas sejam lembradas até uns 30 segundos depois. 


Na lista de nomes de exemplo: 
"João Maria Paulo Carlos José Letícia Alfredo Márcia Jailson Cristina Marcos André Luzia", 
"João, Maria e Paulo" tenderão a ser lembrados durante mais tempo, enquanto que "Marcos, André e Luzia" também ficarão presentes na memória (por serem mais recentes), mas por pouco tempo. Os nomes do meio talvez não sejam lembrados por causa da quantidade ser extensa e, por isso, tornar a percepção confusa. 


Na verdade, este princípio não se resume só a este exemplo, mas sugere que numa leitura a parte inicial é recordada com mais eficiência do que o resto. 


Isto posto, pode-se deduzir que a parte inicial de um documento ou leiaute é a mais importante porque, além de ser a primeira impressão que o receptor estará tendo da mensagem (o que pode definir se ele continuará ou não e se, desse modo, fará ou não a apreensão de toda a informação), esta parte pode ser afetada pela memória de longo prazo e, assim, permitir que a mensagem permaneça armazenada por mais tempo. 


É importante se considerar também a predisposição do consumidor. Se este é impactado por uma publicidade que mostra um produto ou serviço com o qual já tenha alguma afinidade ou que já pretenda consumir, deduz-se, que a empatia com o que está sendo exposto - e, por consequência, sua memorização - será maior. 


Mas a marca é realmente a parte mais importante?


A marca tem um papel importante na composição. Ela é a identidade visual de uma empresa e é  quem define no material publicitário quem está oferecendo o produto ou serviço ao cliente. E como identidade visual ela pode representar algum valor ou princípio que se conecte com o perfil do consumidor como tradição, confiabilidade ou inovação e isso pode auxiliar na venda, mas desde que a empresa seja conhecida e, acima de tudo, tenha uma boa imagem no mercado. 


Só que quando uma empresa anuncia, ela não vende sua marca. Ela vende algo que ela produz -  porque as empresas só sobrevivem produzindo e comercializando alguma coisa. E aquilo que está sendo anunciado é o que, de fato, importa ao consumidor. É o que trará para este o benefício que lhe interessa. Mesmo quando se diz que marcas vendem sonhos, este sonho está atrelado ao que é proporcionado pelo produto consumido - incluindo casos em que esse consumo acontece apenas em virtude da satisfação pessoal em possuir qualquer coisa que pertença àquela marca, independentemente do que seja (mas isso já é assunto para um outro artigo). 


Portanto, a despeito que a marca gráfica possa despertar o interesse do consumidor pela sua simples presença em um anúncio (ou algum outro material gráfico qualquer) o sentido desse anúncio é a divulgação do produto (ou serviço), sendo este aspecto o mais importante. Vale ressaltar que para marcas totalmente desconhecidas, a assinatura do anúncio com essa marca não fará nenhuma grande diferença. De resto, o título, o texto, a linguagem, as imagens e tudo o que compõe este material publicitário serão igualmente relevantes (com a ressalva de que, dependendo da necessidade, uma importância visual diferente será atribuída a cada elemento de acordo com a percepção de quem está desenvolvendo o leiaute/campanha). 


Mas, finalmente, o olho para no final da leitura?


A leitura de um texto é um processo em que, nele, estão embutidas 4 fases (3) que são decodificação, compreensão, interpretação e retenção. É através delas que conseguimos apreender a mensagem, seja ela puramente textual ou com apelos gráficos. 


Durante o processo da leitura, o olho humano realiza movimentos interruptos (pequenas paradas), porém, de forma contínua. Esses movimentos interrompidos são chamados de sacadas. As sacadas percorrem e apreendem alguns trechos de texto durante o percurso permitindo sua compreensão - mesmo que a leitura não seja feita letra por letra como a gente poderia imaginar. Caso uma parte do texto não seja compreendida, o olho faz a reparação utilizando-se da sacada regressiva (que é o movimento de parada e retorno) para, depois, retomar o fluxo normal. 


Em relação ao olho parar no final da leitura de um material gráfico e se manter ali por algum tempo (reforçando, portanto, a memorização), nada foi encontrado que pudesse respaldar isso. 



Impressão final


Se os tipos de material gráfico se resumissem a apenas um, este texto não faria sentido. Mas a gente tem à nossa disposição uma infinidade deles como os livros, os websites, os jornais, as revistas, os anúncios - dentre vários outros - e que atendem nossas inumeráveis necessidades humanas de satisfação pessoal e de comunicação. Toda essa carga de informação por eles trazida acaba por atingir um de nossos órgãos sensoriais mais delicados, que é a visão, o que deveria embutir em nós, designers, uma responsabilidade em entender como as pessoas vão recebê-la (a informação). 


Segundo a teoria da Gestalt (4) "o todo é independente da soma das partes", o que significa que em uma dada composição, a depender de como são agrupados os elementos, esta assume uma identidade particular, deixando de ser uma simples justaposição (5). Portanto, ao invés de simplesmente utilizarmos um padrão de leitura ou de leiaute para tudo o que fazemos, devemos tentar, primeiro, compreender o perfil do nosso projeto e sua finalidade, para que trabalhemos as partes de nosso material de maneira a criar uma relação eficaz entre essas partes transformando esse conjunto em um todo particular, comunicativo e sedutor. 


Procure, então, conhecer regras basedas em estudos, utilize-as se lhe parecerem pertinentes e conteste-as se achar necessário. Lembre-se que se você é designer (ou trabalha em áreas afins), lida com materiais de particularidades e propósitos diversos, portanto, não há como se basear em um único padrão de leiaute para resolver projetos de diferentes fins. 


Há mais coisas a se falar sobre isso, mas acima de tudo estude, questione e experimente, para não se tornar refém de conhecimentos e regras inconsistentes divulgadas a esmo e definidas por um alguém qualquer que nunca saberemos quem é. 


Obrigado pela leitura e bons trabalhos. 


 


NOTAS E REFERÊNCIAS: 

(1) - O diagrama de Gutenberg foi, segundo de sabe, criado na década de 1950 pelo tipógrafo e designer de jornais americano Edmund Arnold (1913 - 2017)


(2) - O termo Efeitos da Posição Serial foi cunhado pelo psicólogo alemão Hermann Ebbinghaus (1850 - 1909) ao fazer estudos sobre a memória humana entre os séculos XIX e XX. 


(3) - Conheça mais sobre o Estudo dos movimentos oculares durante a leitura
Monografias Brasil/escola - Os processos de leitura e letramento,  
Canal do Ensino - As 4 fases do processo de leitura 


(4) - Wikipedia - Conheça sobre a história da Gestalt,
Conheça 8 princípios da Gestalt 


(5) - Mais ou menos quando juntamos "duas bolinhas em cima + uma linha curva embaixo" e este conjunto deixa de ser três elementos desconexos e independentes para se tornar uma "carinha" perceptível. Os emoticons ilustram bem essa ideia:   :)   :(   :O   ^_^   -_-   etc.

Texto técnico-reflexivo tratando do posicionamento físico de marcas gráficas em leiautes.

http://www.visuarea.com.br/artigos/a-disposicao-da-marca-grafica-no-leiaute
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